segunda-feira, 8 de outubro de 2012

a noite que perdi minha alma

Era como se tivesse sido uma viagem astral. Ela tinha certeza de que aquilo acontecia de fato, naquele momento, e ela estava ali. Ela via tudo e nada, como quem observa pra dentro de um espelho e não vê nada além de seu reflexo, mas sente muito, muito mais além daquele reflexo.
Ela acompanhou os passos dele naquela noite, sentia sua presença (tremia de vontade de tocá-lo) e quase, seu cheiro. Viu o sorriso dele refletido no rosto de outra e no momento de carinho fechou os olhos e sentia aquilo como se fosse nela.

Naquela noite, seu espírito, por vontade própria, havia decidido encontrar o espírito dele, o qual ela tanto precisava.
Mas o que houve, não foi um encontro de almas e sim um desencontro.
Mesmo assim, ela ficou ali do lado dele toda a noite, invisível. Curando sua alma da saudade dele.




Hoje eu acordei, e senti um imenso desequilíbrio entre corpo e alma. Só depois de alguns minutos, percebi que minh'alma chegara aos poucos em mim, carregada de uma tristeza que só depois vim entender. Mas ainda com um amor que não cabia na noite de sua pobre alma.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012



Depois de tudo aquilo que acabara de acabar para outras coisas começarem, ela começou a esvaziar o ambiente, deixando espalhado pelo chão, tudo que ela não queria mais. No final do dia, dentre tantas outras coisas, achou um vestido da mãe e um buquet de flores de fita de cetim. Vestiu-se nele, e segurando o buquet sentou-se, porque o peso da saudade pesava em seus olhos e em seus ombros.


segunda-feira, 1 de outubro de 2012

A falta da clave de sol




7:50 AM
Acordou 10min antes do despertador. Ainda teria 10min pra dormir. Mas hoje é segunda-feira e ela precisa de ânimo para que a semana seja breve e leve, muito leve. Mas outra coisa na sua cabeça não a deixa dormir os 10min "extras". Mas também ela não se levanta. Vira pro lado direito de fora da cama, e fica olhando a imensa porta branca de fórmica de seu armário, que está a menos de 50cm de seus olhos. Enquanto fita o branco, possíveis problemas passam por ali, como se fossem um filme que se enuncia cena a cena num prenúncio de frenéticos 30segundos, num misto de lapsos do passado e do futuro.
E assim ela fica por mais 15min além dos 10 que se permitira.
Seus olhos que nunca foram muito grandes, nesse dia levantam-se arregalados, tensos, cheios d'água e preocupados, como quem quer chorar. E de tanto querer, ela deixou eles chorarem, porém debaixo do chuveiro, pra que assim como a água do chuveiro, as lágrimas corram ralo a baixo e nunca mais voltem a ser choradas. No banho de água quente (não teve coragem pra água fria, apesar do calor que fazia), deixou-se quedar longos minutos de reflexão entre ela mesma e a água que percorria seu corpo e fazia dela alguém mais crente. Mas ela não entendia essa crença, se vinha dela mesma ou se era nela mesma; como uma fonte.

Fonte.fonte que nunca seca.Seca a lágrima que vem da fonte.Mas da fonte que nunca seca, vem mais uma lágrima, que em breve seca, mas logo será substituída por outra, que também secará . Só a água do mundo secará. Fecha a água.

Fechou o chuveiro, se enrrolou na toalha e correu pro quarto, onde ficou debaixo das cobertas, tremendo de frio. Mas aos poucos a aérea esperança foi tomando conta da sua cama, e o peso mais pesado foi transformando-se aos poucos em andorinhas. E as andorinhas brotavam de sua cama, debaixo do colchão, debaixo da cama, de dentro dos travesseiros, de dentro do armário, de dentro da porta, do computador, das roupas, dos sapatos... De repente sua cama estava cheia delas. E ela, só com os olhos de fora, mirava tudo aquilo e já esboçava um leve e assustado sorriso. As andorinhas cantavam, cantavam; seu canto ecoava dentro do quarto estremecendo as paredes e assim a menina começou a ficar também frenética. Ainda desnuda, pulava em cima da cama batendo asas, piando como fazia quando era criança, sorria e cantava com as andorinhas, tentava imitar seu canto. E aos poucos, centenas de andorinhas subiam e desciam nas correntes de ar dentro daquele quarto. Alçavam vôo e aterrissavam por todos os lados, e assim, ensinavam a menina a voar e cantar com elas. Ela ensinava sobre as cores, primárias, secundárias, terciárias, tons pastéis, bordô, vermelho, azul, amarelo crespúsculo.... 
De repente, estava tudo colorido. A menina pintava uma a uma as andorinhas e as andorinhas, também felizes por terem novas cores, pintavam a menina por todos os lados, fazendo cócegas e deixando-a rolando no chão de tanto rir, enquanto se enchia de cor, e de asas, que as andorinhas pintavam em suas costas, em seus pés, suas mãos, seus olhos, seus dedos. Asas em tudo que  elas poderiam imaginar. 

(Assim você encontraria o quarto daquela menina que acordara tão triste naquela sgunda-feira; eram cores, pássaros e uma menina. Cores em todos os lados, na parede, no teto, na  porta branca do armário de fórmica; pássaros coloridos, azul, rosa, lilás, amarelo, verde, verde claro, verde musgo, verde abacate...e uma menina, nua e colorida, cheia de asas no corpo, asas coloridas e melhor ainda; pintada por andorinhas tão coloridas quanto ela agora). 

Até que ela se deitou na cama colorida; peito e olhos pra cima, enquanto mirava os vôos das andorinhas, altos e baixos, rápidos, lentos, sublimes. Enquanto as observava, seu corpo quicava na cama de tanto rir daquilo que acontecia, era uma felicidade que estremecia por dentro. Aos poucos, ela sente bicadas por todos os lados e quando vê, está flutuando de verdade. As andorinhas à levantaram e queriam levar ela janela à fora. Ela aceitou e deixou-se levar. Mas as grades da sua janela (impostas pelo medo) não a deixavam passar. Assim, ela racionalmente pensou em sair pela porta e encontrá-las na rua, onde seria levada pra algum lugar, não importava onde. Tudo combinado, então as andorinhas começaram a bater voo e sair uma a uma pela janela para se encontrarem na rua com a menina. Enquanto isso, ela abria a porta do quarto, corria no corredor, abria a porta da casa, descia as escadas, abria todas as portas que a prendiam naquela casa. Até que chegou na rua às carreiras, igualmente nua e colorida, e via as últimas andorinhas saírem de sua janela. Gritava pra que elas a vissem ali e a levassem.

Mas viu apenas as andorinhas tecerem uma longa rede, muito além dos fios tensos da pauta de metal... um longo caminho rumo à um lugar desconhecido.
Só se via onde começava e as cores com as quais foi tecida, mas seu fim, se perdia dentro da imensidão do céu azul daquela cidade, numa segunda-feira de manha, como todas as outras.

E lá estava ela na calçada, com a mão direita de pára-sol, buscando um fio perdido pra que ela subisse naquela teia e saísse dali. Mas não encontrara nenhuma brecha deixada pelas andorinhas. Nenhum fiapo de linha, colorida ou nao, fora deixada para que ela subisse ali. Então ela olhou para si mesma, e ainda estava colorida e cheia de asas por todos os lados, por dentro e por fora. Sorriu, e fechou os olhos pra sentir o primeiro pingo da chuva que o céu prenunciava. Choveu, sentiu, sorriu, e manteve os olhos fechados.
Ao sentir o sol novamente esquentar sua cabeça e seus pés, abriu os olhos e já não se via colorida, nua e cheia de asas. Estava vestida de tênis, calça, blusa e despida de cores e asas. Só lhe sobrara algumas cores roubadas que ainda coloriam seu sonho, que se retorcia e batia asas dentro da mão esquerda querendo sair.

9:45AM
Ela colocou os óculos escuros, um sorrido no rosto e segiu. Estava 1h45min atrasada pro trabalho, numa segunda-feira que já não era como outra qualquer; havia ganhado um sonho em cores, e o tinha nas mãos, louco pra escapulir entre os dedos e sair voando.