sábado, 4 de julho de 2009

Primavera plena

Ela já era uma senhora, de seus 50 anos. Já havia vivido bastante, mas não o suficiente. Se sentia culpada por ter vivido tão pouco. Mas não se culpava, culpava os outros....Isso mesmo; os outros. A culpa não era dela por tão pouco sentimento. Ela nao....ah! ela tinha todo amor do mundo em suas veias estancado pelo tempo; tinha o coração cada dia mais vermelho de tanto ardor. A idade parecia ressaltar tudo isso.. todo esse sentimento a jorrar e todo esse ardor. Ela era tão feliz, apesar dos pesares.... ela tinha quase tudo que sempre quis na vida; mesmo que o que ela mais queria, não tivesse, sabia ser feliz. afinal nada pode ser completo (?). ela pensava daquela forma "algumas pessoas vieram só para amar; outras para serem amadas", logo se sentia lisonjeada por poder amar, amar a tudo e a todos. Amava como ninguém, tivera sido esse seu ofício ao longo da vida. Mas sempre se recordava que sua felicidade não era completa.
Era conformada.
Ao saber dela assim, dessa forma, que agora te conto, você deve ter certeza que algo de estranho ela tinha. Seria uma dessas vilãs de filmes que se passam por boazinhas e na verdade são as piores? seria ela uma velha que estava sempre triste e de mal com o mundo (afinal, tinha alguns poucos motivos para tanto)?
Acredite que não. Ela era adorável! Era do tipo que as pessoas sentem um carinho imenso, admiram, gostam de estar sempre por perto, porque tal presença é como se completasse o que de bom pode faltar dentro de nós. Era do tipo que alguns tinham inveja.
Vivia sozinha.... em meio à móveis herdados da família nada tradicional, em meio à louças baratas, em meio a gatos pela casa, em meio de tudo que a circulava.
Sua rotina era acordar, observar da jenela do seu quarto o ninho de pássaros na copa da árvore e saudar os mesmo (isso quando não se deixava permanecer na cama, entorpecida pelo canto dos mais novos pássaros do pedaço), ia para a cozinha; tomava café. Passava seu dia lendo em uma poltrona velha e repleta de ácaros, mas que era infinitamente confortável! además, tinham o perfume e o desenho do corpo de sua mãe. Ela lia...lia...lia velhos livros, poesias, contos, ficção, so não lia coisas como agatha christie, não suportava! era lixo para ela. Também não lia livros lançados nos últimos 10 anos; ela não sabia porque. Eu também não sei. Lia um velho Drummond; Boitempo. Folheava algumas edições do Pasquim, folheva A hora da estrela, tremia ao pensar em Macabéa, mas no fim, sorria junto com ela. Ela sentava-se ao chão e quase todo dia remexia um velho armário com alguns trabalhos de seus saudosos alunos...lia aqueles poemas sobre o amor dos pequenos, lia sobre futebol, sobre a boneca, sobre os pais de seus alunos, sobre as férias deles. Adorova relembrar dos abraços que recebia ao entrar em sala de aula. Ah...saudosos abraços! Lhes fazia sorrir como se tivesse 10 anos.
Fazia tudo isso, ao som do silêncio mais doce que se possa imaginar, seu silêncio, junto ao cantar de alguns pássaros e lógico, a algumas buzinas e baralhus de carro na rua. Não ela não morava no campo. Quisera por um tempo, mas viu que gostava de mais movimento em volta dela, já astava tanta istagnação em sua vida.
Às cinco da tarde, ia ao seu quarto, abria a janela para sentir as cores do por do sol, liagava aquela vitrola e tomava mais um café. (Seria lindo se fosse um chá, mas não; era de fato um café)
Escutava um Tango por volta de 25 minutos, sentada na sua cama, garrafa de café do lado e as cores do quase findo-sol em mente e olhos. Adorava aquilo tudo. Ao escutar "Adios nonino" do Piazzolla, desabava em lágrimas. Sempre fora assim....nunca soube porque. Nem eu.. Talvez ela sentisse uma paixão ardente por partes de ambos, onde ela não era nenhum dos "ambos". Não era pra ela... talvez por isso ela chorava..chorava por pena de si, talvez.
Eis pois, o que era a hora mais melancolica de seu dia. Era como um ritual. Passava por tudo aquilo, todos os dias; janela aberta, cama, garrafa, café, tango, adios nonino, cores do findo-sol e laágrimas. Quando tudo isso acabava, ela queia tomar um banho quente (Para ela o banho quente era como outra vida, que nos era emprestada, até o próximo por do sol).
Continuava com a vitrola ligada, durante o banho, mas agora escutava um jazz, Chet Baker (trazia em seu sangue um pouco de uma sutil "fineza''). Escutava Baker porque fazia ela feliz.... Mas quando escutava ''My funny valentine", um filme passava sob suas pálpebras, sentia um peso nos olhos e queria chorar. Mas por fim sorria, lembrava do quão foi lindo. O mais lindo, mais impossível e possível.
Mas enfim, durante a noite, saia de casa para ver a rua, dar sinal de vida aos vizinhos que a gostavam tanto, para brincar com o filho de uma suposta conhecida de 4 anos que jogava bola sozinho na rua. Saia com um de seus gatos, um por dia. Passeava com eles nos braços e conversava com eles, falava sobre as corees, a vida e os amores que via.
Voltava para casa sorrindo....o ar da rua lhe fazia bem, as pessoas lhe faziam bem. Quase tudo lhe fazia bem.
Ia para a cama logo cedo... se deitava escutando mais uma vez, um tango, mas agora um Gardel.
Talvez não tenha deixado claro quão ela amava um tango... Era para ela a tradução de desejos, receios e sonhos. Representava para ela uma vida que não foi vivida. Sempre esteve só.
Salvo por algum tempo que se enamorou por um rapaz... ele era diferente, assim como ela. E assim como ela era adorável, sua presença era adorável. Ambos eram do signo de câncer. Ela acreditava nessas besteiras... Eles eram de fato, bem parecidos. Historias diferente e aos mesmo tempo tão iguais, sentimentos que pareciam se completar. Algo como:o sentimento que havia nela, se completaria com o que havia nele. Eram como uma extesnão um do outro. Se conheceram de uma forma quase irreal. Ele frenquentava uma biblioteca, a mesma que ela. ele lia poemas em uma outra liíngua. Deixava anotações dentro de tais livros, deixava até pensamentos completos naqueles livros. Ela sempre via suas anotações em uma língua que não era a sua, sempre lia e interpretava ao seu modo. Achava lindo, ele era lindo! só podia ser... Um dia, quando ela lia uma anotação dele em um livros de Rosario Ferré, ele chegou a procura de tal livro. Estava nas mãos de sua admiradora secreta, que agora deixara de ser secreta para ser amiga-amante-confidente. Foi inevitável. Ela aprendia palavas novas, sentimentos novos. Tudo era novo, tudo era lindo. Foi um tempo o tempo que ela mais havia vivido, foi o tempo que ela sempre se recordava, era na verdade, a mais linda historia que ela teve em toda a vida. A única. Mas algo aconteceu, não sabe-se o que nem porque.... Talvez ela soubesse, ou ele; o melhor escritor, guitarrista, arquiteto, pintor, mexicano, animador de momentos, amante e amigo que ela já conhecera. Alguem deve saber o porque. Eu não sei. Sei apenas que foi a sua primavera em vida plena. era por ele que ela chorava todos os fins de tarde.
Mas foram felizes...ah, como foram!
A vida de nossa amiga fora assim.... apenas entre-cortada por aquela historia e rotina; tangos, por do sol, café... o resto...enfim, só vale lembrar porque era repleto de amor, tudo. Mas na verdade, ela era melancólica apesar de feliz, doce apesar da vida um pouco amarga. Ela gostava de ler, especialmente contos, adorova metáforas e analogias, adorava um Tango de Piazzolla, assim como eu.
O fim da historia dela, foi bela, foi uma celebração à vida, fo repleta de amor, por fim. A minha, estou vivendo. Na primavera plena, mas cuidarei para a historia não se repitir. Deverá ser uma celebração à vida e cheia de amor até o fim e não "por fim".
Mas tenho medo, afinal assim como ela, no fundo eu sou uma sentimental...
Mas por favor, stay My funny valentine, stay.
E me diga para não temer.

À N.

Um comentário:

Niamm disse...

Adoreeeeeeee!!, WOW!!!, voce habla en versos..., no desaparezcas, por favor, Raissa!, tus palabras, las quiero todas...