quarta-feira, 19 de agosto de 2009

"Petite Histoire" daquele barro. Parte I

No penúltimo sábado, dia 8 de agosto, no Instituto Cultural do Banco Real e Grupo Santander, houve um seminário com o Mestre Manoel Vitalino, filho do conhecido Mestre Vitalino, com a presença, mais que especial, de um dos melhores e mais notável museólogos do Brasil, o Raul Lody.
O seminário iniciou com uma breve fala de Lody, para introduzir a fala do Vitalino Filho. Todo o seminário o senhor Manoel falou com uma segurança incrível, afinal, ninguém melhor que ele para falar do se trabalho, trabalho esse que aprendeu com seu pai, Mestre Vitalino. E só para constar, esse trabalho que é passado de geração em geração, é o de fazer arte com barro. Onde ainda hoje se representa as figuras típicas do sertã nordestino, como o vaqueiro tentando pegar um boi, como o grupo de pífanos, o qual o próprio Vitalino fazia parte, os Bacamarteiros de Caruaru... e tantos outros bem típicos que se qualquer brasileiro (que tenha o mínimo conhecimento de sua cultura) vê, vai saber reconhecer suas peças, que tem as cores mais vibrantes, traços bem característicos de arte Naïf, e que são bastante verdadeiras, sem caricaturas.

Ao longo do seminário foram levantadas algumas questões, sobre essa atividade que ainda hoje é tradição em Caruaru. Algumas como; Algumas pessoas, e salvo engano a própria prefeitura da cidade, quer mudar a forma de cocção do barro. Processo esse que sempre foi feito em um forno de lenha, para um forno elétrico. Eles alegam que a medida que se gasta muita lenha para “assar” as peças, vai ficando um “oco” na mata da região, enfim, vai ficando desmatado. Até tem muita lógica, preocupação plausível e tudo mais. Mas talvez não seja essa a melhor saída. Ninguém melhor que Sr. Manoel para dizer que “isso não se faz!!”. É um homicídio à nossa tradição, é uma falta de respeito tremenda, querer mudar algo que é feito há um século, algo que sempre foi feito á lenha, jamais será a mesma coisa se for feito com gás.
E o que é “danificado” (poderia até tirar estas aspas, afinal é danificado SIM!), não é só a tradição, não é apenas a forma de fazer, a própria cor final do barro muda, o tempo gasto no forno elétrico será menor, logo eles terão que repensar em todo processo novamente, talvez até percam peças por passar do tempo no forno, a essência da arte, muda, não é mais tão artesanal assim, é como se aquelas miniaturas de pessoainhas fossem perder sua alma dentre aqueles gases, é como se a lenha lhes desse a vida!
Fazer isso (instalar fornos elétricos no Alto do Moura para os artesãos) é algo irreparável nessa tradição. Mas como diz seu Manoel, o que os muitos “Vitalinos” que há no Alto do Moura (muita gente usa o nome do mestre Vitalino em suas peças para atrair. E vale ressaltar que apenas dois filhos de Vitalino ainda trabalham com essa arte) querem, é quantidade, querem muitas peças, para vender mais, ganhar mais dinheiro. E para eles pouco importa se aquela peça que ele vai fazer, vai perder sua essência, pouco importa para ele se ele vai ta mudando um ritual de um século, em prol de seu “crescimento econômico”. Pouco importa à eles...
E segundo Sr. Manoel, há sim uma saída muito melhor que forno elétrico em suas peças; a medida que for se derrubando uma árvore, que se plante outra (ou outra, talvez duas!) em seu lugar, para que as gerações futuras ainda possam fazer suas peças com alma, com vida, como sempre foram. “Reflorestamento é a solução! Não é preciso colocar nun sei quantos fornos elétricos lá se podemos resolver dessa forma, e ainda por cima, estaremos purificando o ar, nos redimindo um pouco com a mãe natureza que paga por nossos erros”, disse Sr. Manoel com sua imensa sabedoria empírica, melhor que a de muita gente “sabida” da prefeitura.

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